sexta-feira, julho 23, 2010

JM, Diversão Total






O Jornal da Madeira está cada vez mais divertido. Começo a pensar que o dinheiro dos meus impostos encaminhado para esse projecto editorial - ou político? - é um óptimo investimento... na boa disposição da malta, sobretudo em tempos de depressão.

Achei um piadão aos recentes slogans da primeira página, que se transcreve: «Se quer viver informado, leia o Jornal da Madeira» (parte superior) e «Se quer conflitos inúteis, leia e ouça outros» (em baixo).

Apesar disso, proponho uma alteração à primeira frase, substituindo «informado» por divertido ou alegre, pois adequam-se melhor ao teor actual do JM, que nos ajuda a viver melhor, graças às infindáveis gargalhadas que os artigos de opinião e notícias nos causam. Ainda por cima, como não dedica espaço ao pluralismo, todos os textos mantêm a mesma linha de humor único.

A sublime diversão, porém, encontra-se no segundo slogan, pois é uma piada bem conseguida afirmar, em tom de ameaça, que ler e ouvir outros provoca conflitos inúteis... Esta é boa! Como se já não tivéssemos chatices mais do que suficientes, ir procurar outras é mesmo de masoquistas! Bom, provavelmente, este deverá ser humor negro, já que considerar a leitura e audição da concorrência susceptível de gerar conflitos desnecessários é um exercício humorístico desencadeador de risos altamente estridentes...

E ainda há quem queira fechar este pasquim do nosso contentamento! Já imaginaram o que seria de nós sem as piadas sobre os ex-padres, ex-seminaristas e fascistas do outro lado da Fernão Ornelas? Não nos deixem cair nesse tédio, continuem a alimentar essa guerra religiosa entre católicos e protestantes, embora saibamos que ela sirva apenas para "inglês ver", já que os primeiros também têm voz e pena nos órgãos de informação oponentes.

terça-feira, julho 20, 2010

Sondagem sobre congelamento das progressões



Faltam apenas 6 dias para encerrarmos a sondagem que se encontra à esquerda deste écran, onde pretendemos saber «Quem é o principal responsável pela não progressão dos docentes da Madeira».


Como opções de resposta, colocámos a SREC (Secretaria Regional de Educação e Cultura), que, neste momento, recebeu 100% dos votos expressos, o Representante da República, os Sindicatos e os Docentes.

Participe nesta iniciativa deste blogue, que, mesmo sendo parodiante, também aborda assuntos sérios, nem que seja para, posteriormente, melhor caricaturar os vencedores da sondagem.

Não se esqueça: a sua opinião aqui conta! Experimente votar para ver que o seu voto é imediatamente contabilizado!

(Imagem retirada de calipolensebasket.files.wordpress.com)

terça-feira, julho 06, 2010

Que venham mais devoluções



A notícia do dia, no que aos docentes diz respeito, é a devolução, por parte do Representante da República na Madeira, do polémico diploma que, segundo o partido que o aprovou, iria permitir a progressão na carreira dos professores e educadores em exercício de funções na RAM, que parece que estão de castigo, desde 2005, por serem bons, a avaliar pelos elogios públicos do Grande Chefe da Tribo Laranja...

Nas anteriores devoluções a que o ECD-RAM foi sistematicamente sujeito, alegava o Representante do Rectângulo que a classe docente da Madeira ficaria beneficiada. Agora diz o contrário e, ao que apregoa o partido maioritário, Monteiro Diniz prestou "assessoria jurídico-constitucional", aquando da elaboração deste documento. Como é que ficamos, então, para além de eternamente congelados?!

Até parece que tudo se conjuga para que a vontade da classe política dirigente seja sempre satisfeita, actuando de forma aparentemente consertada para prejudicar os docentes, repartindo alternadamente responsabilidades pelos sucessivos entraves colocados ao não desbloqueamento da situação. Entretanto, quando surge a ocasião, o Big Boss encarrega-se de insuflar ar no peito dos professores e educadores, através de elogios de circunstância, que muitos aplaudem, sem perceber que estão a ser enganados...

Se não é isto, então, trata-se de pura incompetência! Nesse caso, só nos resta pedir que também sejam todos devolvidos ao anonimato donde saíram, às suas profissões anteriores, porque já estão todos fora de prazo.

Entretanto, resolva-se a situação da classe docente regional, adaptando à RAM o ECD nacional, com a máxima urgência. Por fim, encerrem definitivamente a Assembleia Regional e o Palácio de São Lourenço, já que não são capazes de solucionar um problema como este, que até nem é dos mais complexos, juridicamente falando. Seria uma forma de se poupar milhões de euros, sem ser à custa do elo mais fraco, os trabalhadores.

sábado, julho 03, 2010

Resposta e contra-resposta de e a Miguel Tiago


A propósito do nosso penúltimo post - O grande exemplo da Educação madeirense -, quis o sr. deputado Miguel Tiago divertir-nos com as suas explicações acerca das declarações que proferiu após reunião na SREC. Apresentamo-las na íntegra bem como a reacção bem disposta que as mesmas nos merece:

«Caro amigo João Ramos Sousa,

Quero em primeiro lugar cumprimentá-lo pela administração do seu blog e pelas suas posições críticas perante a realidade com que não se conforma. A insatisfação concretizada é, nos dias que correm, uma escassa riqueza.

No entanto, gostaria de lhe dirigir uma breves correcções.
O deputado comunista que refere no seu post de 14 de Junho sobre a visita da Comissão Parlamentar de Educação e Ciência sou eu próprio e julgo que deveria informar-se melhor sobre as posições que o PCP expressou nessa visita antes de poder escrever como escreveu. Para tal, é importante que eu possa esclarecer-lhe alguns pormenores que podem não resultar claros da leitura da imprensa regional ou sequer do visionamento dos jornais televisivos.


1. Em momento algum, o PCP foi entrevistado ao longo dessa visita. De forma alguma, tive oportunidade de representar ou apresentar as posições do meu Partido nas entrevistas em causa, tenham sido para rádio, televisão ou jornais.
2. Todas as declarações que prestei à imprensa foram estritamente no âmbito da tarefa institucional que estava a desempenhar, como Presidente da Comissão de Educação e Ciência da Assembleia da República. Como tal, deixei várias vezes claro junto dos jornalistas que não teceria comentários de natureza política sobre qualquer reunião tida na RAM, pois não estava ali para julgar absolutamente nada enquanto Presidente da Comissão.
3. Caso não saiba, o que é natural, os Presidentes das Comissões Parlamentares falam por todos os Grupos Parlamentares, não podendo por isso expressar as suas posições políticas próprias. Isso significa que, quando em tarefa de presidência, o deputado reveste-se de uma tarefa distinta, não podendo ou não devendo falar em nome do seu partido, mas em nome de toda a comissão.
4. Em momento algum, posso assegurar-lhe, valorizei ou desvalorizei a política do governo da RAM na qualidade de Presidente, até porque isso seria de todo incompreensível no quadro de uma visita institucional e seria um desrespeito pela autonomia, sendo que, no caso concreto eu estava em representação da Assembleia da República e não do Grupo Parlamentar do PCP. Imagine o que seria, o Presidente da Assembleia da República dirigir-se a um Estado estrangeiro ou a uma Região autónoma e criticar a organização política do estado que visita. É uma questão de cumprimento da tarefa que nos foi confiada…
5. Como é óbvio, não me agrada nem agradou, de forma alguma ser o chefe da delegação parlamentar da AR na visita à RAM. Como certamente compreenderá, teria muito mais convicção se estivesse livre em representação do meu Grupo Parlamentar. O que aliás já sucedeu. Aproveito para lhe dizer que tenho todos os motivos para criticar o governo da RAM, particularmente tendo em conta que na penúltima deslocação que aí fiz em representação do GP PCP me foi barrada a entrada numa Escola Secundária, em claro desrespeito pela Lei da República e pelo Estatuto dos Deputados. Situação que denunciei em bom tempo e para a qual não recordo ter tido o seu apoio na denúncia.
6. As minhas declarações enquanto Presidente da Comissão Parlamentar cingiram-se estritamente a assinalar informações que nos foram dadas, sem tecer juízos de valor. Referi que o esforço da Universidade e dos Projectos de Investigação em energia poderiam vir a afirmar-se no plano internacional e nacional, caso viessem a dar frutos. Referi que tivemos oportunidade de conhecer uma realidade diferente no que toca à Educação, de acordo com as informações da SER, e quando questionado se queria destacar alguma disse o seguinte: “é curioso verificar que não é líquido que tenham de existir quotas para muito bom e excelente na avlaiação e que não seja obrigatório optar por directores de escola, podendo manter-se o órgão colegial”. Foi essa a minha resposta a uma questão concreta. Não estou a valorizar nem a desvalorizar, mas apenas a assinalar que, mesmo num quadro de políticas educativas negativas, não é líquido nem fatal que tenha de se optar por imposições como no continente. Foi a única coisa que assinalei.
7. Como é óbvio, e apelo a sua compreensão para esse facto, apenas nas reuniões – no interior das salas – expressei a posição do meu Partido, nomeadamente nas reuniões com o SR Ciência, com o SR da Educação e com a Comissão de Educação da ALRAM. Nessas reuniões, com a legitimidade de deputado do PCP questionei e confrontei PS e PSD com as suas políticas de destruição da escola pública, de privatização e de desmantelamento. Julgo que qualquer pessoa compreenderá que teria sido inaceitável fazer-me valer do facto de me encontrar em substituição do Presidente da Comissão de Educação e Ciência – Deputado Luís Fagundes Duarte, do PS – para falar em nome da Comissão transmitindo as posições do PCP.

Lamento pois que a Comunicação Social não tenha deixado claro que as declarações que fiz – que não teceram qualquer tipo de juízo positivo ou negativo – não tenham sido pronunciadas enquanto deputado comunista, mas enquanto substituto do Sr. Presidente da Comissão de Educação e Ciência.

Perguntar-me-á se me agradou fazer tal papel. Responder-lhe-ei que não. Que preferiria ter desempenhado o meu papel de Deputado em representação do PCP dentro e fora das reuniões. No entanto, referi várias vezes à comunicação social que cada Grupo Parlamentar faria a sua interpretação do que ouviu e do que viu e que cada um leva mais conhecimento e mais experiência e que as posições dos Grupos Parlamentares seriam diversas. Peço-lhe que não julgue as posições do PCP com base apenas do que lê numa imprensa ou ouve na rádio e telejornais que são precisamente os mesmos que paulatina e sistematicamente atacam o PCP e as suas posições, distorcendo sempre que necessário. Mais ainda lhe peço que não julgue as posições do PCP por via de declarações inócuas – vazias praticamente de qualquer conteúdo político e partidário – que um deputado comunista possa fazer quando se encontra em representação da Assembleia e não do seu Grupo Parlamentar.

Aproveito para lhe afirmar que não deve temer a falta de apoio e solidariedade do PCP-M, tal como do PCP, das suas estruturas e das suas representações institucionais pois é firme o nosso compromisso com a defesa da actividade docente, com a dignificação dessa carreira, como elementos essenciais e incontornáveis para a defesa da escola pública, quer no continente quer nas regiões autónomas. Estou aliás, certo de que conhece esse compromisso do PCP e que nunca encontrará no PCP um partido que vire as costas à luta. Afirmo-lhe também o nosso firme compromisso, regional e nacional, de combate às políticas de precariezação dos recursos humanos na educação, de propaganda e de ataque à qualidade do ensino.

Informo-o, aproveitando esta ocasião, de que na reunião da Comissão de Educação da Assembleia Legislativa da RAM estiveram presentes o PS, PCP, CDS e PSD, por parte dos deputados regionais e o PS, PSD, CDS e PCP por parte da Assembleia da República. Dessa reunião, apenas o PCP e o PS regional criticaram o sistema educativo da Madeira e deixaram diversas preocupações em cima da mesa. O Deputado do PS chegou mesmo a atacar veementemente a Escola a Tempo Inteiro entretanto em prática na Madeira. Porém, os deputados da Assembleia da República do PS valorizaram o inglês no primeiro ciclo, a escola a tempo inteiro e um conjunto de outras políticas regionais, tal como fez o PSD. O CDS apenas colocou questões e não teceu comentários de juízo político. O PCP criticou o rumo de submissão da Escola ao Mercado e a privatização galopante do sistema educativo, criticou as políticas de recursos humanos e as actividades de enriquecimento curricular, acusando o Governo da República e o Governo da Região de agirem à margem da Lei de Bases do Sistema Educativo. Permita-me até que partilhe consigo a brincadeira que fiz com o Deputado do PS-Madeira ao dizer-lhe: “finalmente percebi porque é que os deputados da madeira se abstêm nas votações da assembleia da república quando se fala das regiões, é que, de facto, as vossas posições não têm absolutamente nada a ver com as posições do PS no continente.”, pois quem ouvisse o Deputado do PS-M jamais diria que é do mesmo partido que está no poder em Portugal e que é orientado por Sócrates.

Como vê, o único Partido que foi, de facto incoerente, foi o PS, defendendo uma coisa na ALRAM e outra na AR, o que ficou bem patente na reunião com a Comissão de Educação da ALRAM. O BE esteve ausente em toda a visita, quer por parte dos deputados regionais, quer por parte dos deputados da república.

Espero, de alguma forma, ter contribuído para desfazer aquilo que julgo ter sido um compreensível equívoco. Caso contrário, não hesite em contactar-me para me exigir as devidas explicações.

Melhores cumprimentos,

Miguel Tiago, Deputado do PCP»

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Contra-resposta

«Viva!

Começo por pedir desculpa por apenas agora lhes responder. Sabeis como é a vida dos professores… não fazem nada, mas as tarefas são cumpridas, como exames nacionais corrigidos, matrículas efectuadas,…

Antes de mais, lamento imenso ter feito perder parte do tempo precioso do sr. Deputado Miguel Tiago e do Vice-Presidente da Comissão de Educação e Ciência da Assembleia da República com o mesmo nome, porque isto de uma pessoa andar a se desdobrar em papéis e protagonismos diversos não é tarefa fácil. A não ser que tenha o dom da ubiquidade ou, então, que tenha a genialidade de Fernando Pessoa, que se
multiplicou em diferentes heterónimos…

Vossas Excelências têm toda a razão! Trata-se, efectivamente, de um enormíssimo equívoco tudo o que foi parodiado no blogue, já que se infere do esclarecimento que nos foi enviado que, na verdade, o Vice-Presidente da mencionada comissão, no exercício pleno desse cargo, foi obrigado pelos membros da mesma a ler uma comunicação neutra (Telejornal Madeira, 20´14´´) aos media, onde releva aspectos positivos do sistema educativo madeirense como a inexistência de quotas para aceder aos níveis de excelência. Ficou claro que tudo isto foi feito sob protesto do deputado Miguel Tiago, que, coerentemente, se manteve fiel às posições do seu partido e do eleitorado que representa. Penitencio-me, pois, por não ter feito essa leitura, nas entrelinhas da comunicação social, que, evidentemente, distorceu factos ao não mostrar as espingardas atrás das suas costas a coagi-lo. Por conseguinte, também culpo-a por me ter induzido em erro. Como não fui capaz de deduzir que tais declarações resultavam de uma forte coacção exercida pelos outros deputados da Comissão e do elevado sentido de Estado do referido Vice, sempre pronto para cumprir as suas funções de alta autoridade nacional?! Jaime Gama e Almeida Santos também queixaram-se da falta de compreensão dos madeirenses relativamente aos elogios proferidos enquanto autoridades nacionais… Enfim, nós, madeirenses, somos assim: tão pequeninos que apenas vemos os nossos umbigos e não alcançamos os desígnios estadistas das autoridades nacionais!

Garanto, por outro lado, ao sr. Deputado Miguel Tiago, do PCP, que não tenho dúvidas quanto às suas razões de crítica relativamente ao Governo Regional da Madeira, em matéria educativa. Quem é que não as tem? O problema é o Vice, que, com o deslumbramento evidenciado, pode contagiar o referido parlamentar. Uma vez que o lamentável episódio do acesso vedado a uma escola da RAM aconteceu antes do tribuno da nação desempenhar o mencionado cargo, é legítimo questionar se actualmente participaria numa iniciativa político-partidária anti-SREC. A este propósito, é natural que não se recorde do meu apoio à mencionada denúncia, pois explicitamente não o fiz. Este blogue fez um ano no passado mês de Maio e esse incidente, se não me falha a memória, é anterior...

Por fim, e para encerrar esta paródia, pois não posso levar a sério este episódio, sob pena de deixar de acreditar nos nossos representantes no parlamento nacional, permita-me, sr. Deputado Miguel Tiago, um conselho amigo: quando vier à Madeira, deixe o Vice em Lisboa, porque ele só atrapalha e, além do mais, não votámos nele, logo ele não nos representa, e não se esqueça que para, para o bem e para o mal, você é que foi eleito deputado do PCP e, se desempenha esse serviço à comunidade e outros cargos institucionais na Assembleia da República, é essencialmente devido ao voto popular. Escudar-se no estatuto de autoridade nacional fica-lhe bem, mas não o iliba de responsabilidades. Aliás, se assim fosse, nunca poderíamos acusar Sócrates de ter metido o socialismo na gaveta, enquanto Primeiro-Ministro, pois fê-lo no exercício de um cargo governamental e não político-partidário... Como custa admitir o erro!...

Cumprimentos,

João Sousa»

Tributo a Saramago


José Saramago, o nosso Nobel da Literatura, partiu. Ainda me custa aceitar a ideia de que não terei o prazer de ler novos romances deste singular escritor da Língua Portuguesa. Confesso que, em certo sentido, me sinto "órfão" ou como alguém afirmou, no elogio fúnebre, fiquei sem palavras «porque Saramago levou-as todas». Daí esta ausência de postagens.

Contudo, Manuel Alegre, que ainda não é o Presidente da República e que assumiu uma postura de grande estadista, afirmou, com grande clarividência, que «o melhor tributo que podemos prestar a José Saramago é ler as suas obras. Nesse sentido, reproduzo, abaixo, um excerto de Memorial do Convento, um autêntica paródia ao reinado de D. João V, que é a metáfora da obras megalómanas dos dias de hoje:

«D. João, quinto do nome na tabela real, irá esta noite ao quarto de sua mulher, D. Maria Ana Josefa, que chegou há mais de dois anos da Áustria para dar infantes à coroa portuguesa e até hoje ainda não emprenhou. Já se murmura na corte, dentro e fora do palácio, que a rainha, provavelmente, tem a madre seca, insinuação muito resguardada de orelhas e bocas delatoras e que só entre íntimos se confia. Que caiba a culpa ao rei, nem pensar, primeiro porque a esterilidade não é mal dos homens, das mulheres sim, por isso são repudiadas tantas vezes, e segundo, material prova, se necessária ela fosse, porque abundam no reino bastardos da real semente e ainda agora a procissão vai na praça. Além disso, quem se extenua a implorar ao céu um filho não é o rei, mas a rainha, e também por duas razões. A primeira razão é que um rei, e ainda mais se de Portugal for, não pede o que unicamente está em seu poder dar, a segunda razão porque sendo a mulher, naturalmente, vaso de receber, há-de ser naturalmente suplicante, tanto em novenas organizadas como em orações ocasionais. Mas nem a persistência do rei, que, salvo dificultação canónica ou impedimento fisiológico, duas vezes por semana cumpre vigorosamente o seu dever real e conjugal, nem a paciência e humildade da rainha que, a mais das preces, se sacrifica a uma imobilidade total depois de retirar-se de si e da cama o esposo, para que se não perturbem em seu gerativo acomodamento os líquidos comuns, escassos os seus por falta de estímulo e tempo, e cristianíssima retenção moral, pródigos os do soberano, como se espera de um homem que ainda não fez vinte e dois anos, nem isto nem aquilo fizeram inchar até hoje a barriga de D. Maria Ana. Mas Deus é grande» (p. 11).


Até sempre, Saramago!